segunda-feira, 28 de março de 2011

PERDOAR QUEM?

 Me pediram uma reflexão sobre o PERDÃO.

Antes de refletir (já que faço isso enquanto escrevo e nunca reviso o que escrevi) quero alertar que não me proponho fazer uma reflexão sob nenhum ponto de vista religioso ou moral. É comum que esse tema seja tratado sob um olhar religioso, e acho que seria até mais fácil fazer isso. O perdão ganharia uma aura divina e cristã, mas confesso que nunca estudei esse tema sob esse olhar. Tentarei refletir sobre perdão, como psicóloga e na minha experiência como pessoa comum.

Minha primeira reação foi pensar que não conseguiria escrever sobre um tema que na verdade, pouco tenho refletido na minha vida. Daí, comecei a pensar nisso. Resolvi buscar um gatilho de reflexão levando essa discussão para o twitter. Perguntei o que as pessoas pensavam sobre esse tema. Perguntei se elas gostariam que eu escrevesse sobre ele. Foi legal a resposta. Queriam sim. 

Como em um grupo de terapia virtual, as pessoas falaram, me disseram sobre suas experiências com o PERDOAR, ou com a necessidade de fazê-lo. Fiquei tocada com a importância do perdão para elas em contaste com a minha quase inexistente reflexão sobre esse tema. É claro que fiquei meio desconcertada com minha falta de prática nesse tema. Quase comecei a moralizar meu comportamento e me culpar por isso, mas isso durou alguns segundos...foi aí que comecei a entender minha relação com o perdão. Escrevo aqui agora, sem nenhuma pretensão de fechar esse tema que só comecei a adentrar!

Tenho um problema: Me perdôo muito facilmente. Não consigo sustentar por mais de alguns segundos um sentimento de culpa. Sou por demais condescendente comigo. Sei que exagero nisso as vezes. Tenho um olhar mole sobre meus erros e falhas. Digo brincando que meu grau de obsessividade é zero, quase nada de perfeccionismo. Tenho alguma coisa meio libertária na minha alma (longe de ser uma psicopata por que tenho noção clara do que posso ou não, e uma noção importante sobre o respeito que devo ao outro). Acho que tenho um problema sério também em ser julgada. Normalmente não levo a sério pessoas que me julgam ou tentam me enquadrar. Confesso, sou permissiva demais comigo.

Mas por outro lado, não tenho costume de colocar culpa em ninguém pelas coisas que acontecem comigo. Não tenho problemas em me implicar ou me auto-responsabilizar. Por isso, tenho uma dificuldade enorme de me sentir vítima de alguma coisa, ou de alguém.  Acho que faço besteiras, bobagens e me saboto algumas vezes. Na maioria das vezes, por acomodação, deixo de seguir minha intuição, e me pego sendo trapaceada por alguém, mas nem consigo achar que esse alguém tenha de fato toda responsabilidade. Se eu for honesta comigo, vou perceber que em algum nível eu intuí aquilo ou sabia da chance daquilo acontecer, e até mesmo havia sido alertada por outras pessoas.

Penso que crianças são vítimas de adultos. Em uma guerra, os desarmados são vítimas de quem tem maior poder bélico..ou seja, em uma relação desigual existe vítima e algoz. Uma vítima de tortura imobilizada pelos seus algozes é um exemplo disso. Já fui assaltada cinco vezes..fui vítima de ladrões violentos,é um fato incontestável, e em nenhum momento senti necessidade de perdoar nenhum deles. Talvez porque nunca os tenha personalizado. Eles não faziam nada contra a minha pessoa em especial, eles fariam aquilo contra qualquer um que ali estivesse. 

As ações que criam vítimas são as que pedem perdão. Não tenho tido relações desiguais em termos de força desde que deixei a adolescência. Talvez por isso mesmo, não tenho conseguido me sentir vítima de muita coisa na minha vida adulta. Entendo que não preciso sustentar relações que não me servem. Se elas não servem para o meu crescimento, não servem pra nada. Não preciso delas, mas entendo que elas devem servir para outras pessoas, apenas não servem para mim. 

Não preciso em nome de um "perdão" ou uma "bondade" mantê-las perto de mim. Posso, de forma adulta, escolher com quem me relaciono ou não. Não penso muito nessas pessoas depois que entendo isso. Elas não me fazem falta, porque não alimento aversões. Não as odeio, Mas nem tampouco me cobro ser boazinha com elas. Acho que definitivamente não sou boazinha mesmo. Entendo que elas não devem estar perto da minha alma, mas...não tenho necessidade de perdoá-las, porque não me acho vítima delas.

Por muitos anos fiz terapia e cuidei das feridas da minha alma, aquelas que nem conhecia, mas que funcionavam como uma pele fina...qualquer coisa ou qualquer pessoa que se aproximasse delas, causavam uma espécie de sangramento. A terapia me ajudou a reconhecer como falta e aprender a lidar com elas. Elas não serão preenchidas, mas não precisam sangrar toda vez que algo as tocarem. O auto-conhecimento nos instrumentaliza para lidar com isso e nos fortalece. Saímos assim do lugar de criança machucada, essas sim  foram vítimas. Não precisamos ser mais, podemos estar no mundo adulto de igual para igual com qualquer um.

Agora, me "perdoem", prometo que continuarei a refletir sobre perdão em outros posts..., mas agora preciso me perdoar por ter comido uma caixa imensa de chocolate enquanto escrevia.

Já me perdoei. Eram deliciosos. Impossível resistir. Completamente perdoada!

Ludmila Rohr

segunda-feira, 21 de março de 2011

GENTILEZA gera GENTILEZA

 Amo esse mantra: "Gentileza gera Gentileza" porque de fato acredito nele. Acredito nos ensinamentos do Mahatma Gandhi sobre o AHIMSA (não-violência), que muitas pessoas confundem com passividade, mas que é um movimento ativo de Ser Não-violento. 

Conheço pouco do "Profeta Gentileza" do Rio de Janeiro. Sei que essa era uma das suas frases preferidas...sei também que nesse mundo nosso, ele era um "louco" ou alguém que não se encaixava nos padrões que as pessoas são consideradas sãs. Ele acreditava que ações gentis gerariam mais gentilezas e que o mundo seria melhor assim e pregava isso. Acreditava que podíamos multiplicar essa energia com nossas ações, ao invés de multiplicarmos a inveja, a ganância e a violência. Era um louco, assim como Mahtama Gandhi poderia ser considerado também.

No último fim-de-semana tivemos uma lua especial, era a maior lua dos últimos 20 anos. Quis vê-la da rua. Moro em uma cidade grande, Houston no Texas. Decidimos ir a um parque público. Passava das 9. Era tarde para os padrões americanos. Fomos para o centro da cidade. Estacionamos o carro em um lugar que meu marido achou suspeito. Estava ermo, ninguém por perto. Nosso padrão brasileiro acostumados com a insegurança, deixou todos os nossos sensores de medo em estado de alerta. Tínhamos um certo grau de tensão. Não conhecíamos aquele parque. Resolvemos que seria melhor, por medida de segurança, deixar a bolsa no carro, mas levei minha câmera fotográfica. Situação impensável em Salvador, andar em um parque público, à noite e com uma máquina fotográfica.

Ao entrarmos percebemos que era um parque público para praticantes de skate. Muitas pistas e rampas. Iluminado e super bonito. Poucos adultos. Relaxamos. Vimos crianças brincando de skate. Alguns pais acompanhando-as. Muitos adolescentes. Resolvemos andar. A lua realmente estava linda. Andávamos por uma trilha. Silêncio, noite fresca. Tirei o iPhone do bolso da calça para fotografar a lua e poder enviar fotos imediatamente para o Twitter. De repente um adolescente que estava distante vem na nossa direção. Uma certa apreensão típica de "gato escaldado" toma conta de mim. Ele se aproxima e gentilmente me avisa que algum papel  havia caido do meu bolso quando eu peguei o iPhone.

Foto da Lua que possibilitou essa experiência
Eu meio boba e envergonhada, agradeço. 

Sou extremamente grata a esse garoto que andava de skate nesse praça a noite. Obrigada pela gentileza imensa que me fez chorar. Obrigada pela gentileza simples que me deixou envergonhada. Obrigada por ter me deixado sem ação. Obrigada por produzir em mim um estado em que a única coisa a ser dita era: Thank you! Thank you so much! 

O que havia caido no chão era um papelzinho sem importância, uma nota de uma loja que foi em seguida para o lixo, mas o que esse garoto provocou em mim com sua gentileza, não tem preço.

GENTILEZA gera GENTILEZA!

Ludmila Rohr

segunda-feira, 14 de março de 2011

Mãe é mãe!

 Chorei essa semana. Não que isso seja uma notícia, mesmo porque sou a pessoa mais chorona da vida. Choro muito facilmente de alegria e de tristeza...simplesmente choro e acho muito estranho quando alguém diz pra eu não chorar. Penso na quantidade de cliente que já tive, que passava meses em terapia (pagando) pra aprender a chorar, pra conseguir expressar uma emoção. Já conheci muita gente que adoeceu e continua adoecendo por não conseguir chorar.

Esses dias chorei algumas vezes de saudade do meu filho que mora no Brasil. Chorei de saudade da minha vida lá. Essa semana tive alguns dias de banzo. Acho que o fato de meu marido ter feito os exames de revisão semestral do câncer mexeram comigo também (chorei de alívio por isso).

Nessas horas nada como a casa da gente. E por mais que eu adore estar vivendo essa experiência aqui nos EUA, aqui não é a minha casa, nem nunca será. Simplesmente porque nossa casa é o lugar onde temos história. Onde temos lembranças. Minha casa é o Farol da Barra onde cresci, minha casa é o lugar onde vi meus filhos crescerem. Penso que nossa casa será sempre o lugar onde vimos o maior número de pores-do-sol em toda a vida!  

Nenhuma reclamação de estar aqui. Gosto daqui. Mas é impossível negar a saudade que as vezes bate. Talvez exatamente porque eu não a negue, que eu consiga viver muito bem aqui. Consigo fazer planos,  fazer amigos, produzir e viver bem.

Mas....essa semana que passou chorei por uma emoção bem linda também. Minha mãe me emocionou muito. Já falei algumas vezes sobre minha mãe aqui, mas bem menos do que ela merece. Então aí vai.

Minha mãe é uma filha de 11 irmãos de uma família muito pobre em Manaus. Ela casou-se com o primo (isso mesmo, meu pai é primo da minha mãe). Saiu de Manaus sozinha pra encontrar com o já então marido no Rio de Janeiro, eles casaram por procuração, numa época que voar de Manaus até o Rio era como dar a volta ao mundo. Ela teve o primeiro filho no Rio e as 3 filhas em Salvador. 

Minha mãe não teve uma vida fácil. Só lembro dela trabalhando. Por muitos anos ela teve 3 empregos. Era professora. Ela era muito amada por seus alunos, muito querida. Não lembro de alunos que não tenham gostado dela como professora. Ela ensinava no mesmo colégio que eu estudava. Minhas irmãs foram alunas dela (acho que foram as 2 únicas alunas a não gostarem). Todos diziam que ela era uma excelente professora. Acho que até sentia algum ciúme dos seus alunos.

Como ela ensinou muitos anos para pobres e para ricos (escola pública e particular), era comum ser parada na rua por camelôs que haviam sido seus alunos, policiais, garçons e também médicos, advogados ...e amigos meus e dos meus irmãos. Todos falavam sempre com muito carinho dela. Até aqui em Houston, quando ela esteve me visitando, ela foi reconhecida por uma ex-aluna.

Minha mãe era muito linda, chamava atenção pela postura altiva. Ela inclusive parece mais alta do que de fato é por conta disso. Era charmosa e ainda é. Adorava contar piadas e ser o centro, como todo bom leonino. Lembro dela com roupas amarelas. Poucas pessoas ficam bem vestindo amarelo (eu acho). Ela ficava linda de amarelo.

Quando éramos pequenos, ela virava noites costurando nossas roupas pra São João...pois os babados dos nossos vestidos eram os mais bonitos. Ela fazia saias curtinhas e de fato, ficávamos as mais lindas. Os laços da nossas maria-chiquinha eram os mais bonitos. No carnaval era a mesma coisa...lembro das nossas fantasias..ela sempre caprichou muito. Assim como nossos uniformes da escola. Eu fui uma menina muito vaidosa e ela alimentava isso. Lembro de sair com ela e voltar cheia de anéis coloridos, que eu usava em todos os meus dedos.

Minha mãe nunca foi uma mãe de demonstrar afetos com carinhos, nem com palavras. Ela tem dificuldade com isso. Somos bem diferentes em algumas coisas. Eu choro muito e em qualquer lugar.  Ela chora pouco e escondido. Por quase minha vida toda, achei que ela não soubesse chorar. Lembro quando meu irmão sofreu um acidente grave, e quase morreu. Meu pai chorava, e ela não. Achava estranho, mas pensava que ela devia chorar escondido. Acho que ela aprendeu a lição dos sobreviventes. Ela teve que ser forte. Ela teve que endurecer na sua vida em um tempo que endurecer significava não mostrar sentimentos.

Sempre tive muita certeza de que qualquer coisa que eu precisasse que poderia contar com meus pais. Isso pra mim era uma convicção. Eles sempre fizeram tudo por nós. Não consigo me lembrar de ter precisado de minha mãe e ela ter colocado alguma dificuldade pra me ajudar. Se eu precisasse que ele fosse muito longe buscar algo pra mim, ela faria, e  faz até hoje, pra todos os filhos e netos. Ela simplesmente faz o que a gente precisar que ela faça.

Essa semana ela me mandou uma caixa do Brasil pelo correio. Mandou café (quem me conhece sabe o quanto adoro café) e outras coisinhas. Essa caixa ganhou muitos significados e mobilizou muitas emoções. Chorava como uma criança abrindo-a. Choro de novo enquanto escrevo. Senti uma gratidão tão grande. Nem consigo dizer exatamente o que senti, mas chorei muito...como uma criança. 

Minha mãe lê o meu blog. Ela é uma leitora fiel. Ela lerá esse post, e acho que vai se esforçar pra não chorar. Espero realmente que ela não consiga, porque sei o quanto chorar faz bem. Então vou aproveitar e dar um empurrãozinho dizendo: Mãe, obrigada. Obrigada por me deixar tranquila em saber que Caio está aí com voce. Voce e meu pai são as únicas pessoas que eu deixaria os meus filhos com tranquilidade. Obrigada por cada vestido de São João que voce costurou pra mim. Minhas roupas de samba-de-roda e de baiana das apresentações de folclore eram sempre as mais bonitas, obrigada por isso.

Obrigada pela caixa que veio carregada de amor e com uma imensa vontade de agradar. Tenha certeza de que voce conseguiu.

Te amo muito.

Afinal, mãe é mãe.

Ludmila Rohr



segunda-feira, 7 de março de 2011

O Melhor presente eu me dou!

 - "O Melhor presente eu me dou!"

Essa foi a lição que essa minha amiga me deu essa semana. Achei tão incrível e simples, e como amanhã é o Dia Internacional da Mulher resolvi escrever sobre isso!

Era véspera no aniversário dela e ela me contou que todo ano compra algo bem legal pra ela mesma, embala pra presente e guarda até a época do seu aniversário. Ela se dá esse presente nessa data. Estava com ela no dia que ela se deu um lindo presente e me contou dessa "tradição". Amei.

Vivemos dizendo coisas absolutamente comuns e que todo livro de auto-ajuda diz, como: Devemos nos amar se queremos ser amadas! ou que devemos reconhecer primeiro o nosso próprio valor se queremos que o outro também o faça!..ou, Se valorize! Frases simples que parecem tão clichê que nem levamos muito a sério.

Essa amiga é muito querida. Tem uma família linda, um ótimo marido, filhos lindos e queridos. Ela é amada por muitos amigos. Ela é respeitada e muito querida. Ela provavelmente ganhou muitos presentes no dia do seu aniversário, ganhou até uma festa surpresa, mas o MELHOR PRESENTE ela quis se dar! Não é lindo isso?

Ela reconhece que merece o melhor dela mesma. Ela cultiva alegria, mas sabe ser profunda. Tenho a nítida sensação que poderia conversar sobre qualquer assunto com ela, sem ser julgada e sem causar espanto algum. Ela é madura, mas é absolutamente jovem. Ela não se esconde. Mostra sua força, mas também também tem habilidade de falar sobre tristezas e dores. Ela cultiva amigos assim como cuida da sua família, com carinho e dedicação. A casa dela é acolhedora e parece que está sempre aberta. Ela naturalmente se torna o centro em qualquer lugar ou reunião. Ela é "Solar"! 

Ela tem uma qualidade que vale ouro e que reflete seu elevado auto-conhecimento: Ela sabe rir de si mesma! Ela se leva tão a sério que consegue fugir das atuações egóicas e vaidosas que nos impede de rir das nossas bobagens. Ela sabe rir sinceramente de si mesma, mas nunca a vi rindo de fraquezas alheias ou brincando de forma desrespeitosa com alguém.

Ela é uma pessoa do bem. Ela certamente é uma pessoa que acredita na Vida e na ARTE DE VIVER BEM! Ela realmente decidiu ser feliz. Acho que ela tem sido bem sucedida, embora a vida não tenho sido só de flores. Ela como poucas pessoas, conseguem falar das faltas, sem perder a beleza e sem se vitimizar.  Não a vejo moralizando nada. As coisas não são feias ou bonitas. Morais ou imorais. Ela consegue contextualizar e  ver o valor das pessoas e situações. Consegue mostrar fragilidade sem perder a força. Gosto dela.

Não a conhecia antes de vir morar em Houston. Seus filhos cresceram aqui, e ela tem uma filha que adoraria que fosse minha! Sempre brinco com ela que roubarei a filha dela, mas ela sabe que essa é uma forma indireta de elogiá-la. Sua filha é uma mulher linda !! 

Muitos anos se passaram desde que ela veio do Brasil com seu marido e dois filhos pequenos (um terceiro nasceu aqui depois)...., mas tenho a nítida sensação de que sentirei muita falta dela quando me for. Uma coisa tenho certeza...no meu próximo aniversário, eu me darei o meu melhor presente e lembrarei dela em todos os anos que vierem!!!

Obrigada amiga querida por partilhar comigo sua energia contagiante!

Ludmila Rohr