terça-feira, 27 de março de 2012

ELES CHEGARAM LÁ, MAS A LUTA CONTINUA!

 Vivi um momento interessante essa semana aqui em Seul e compartilharei com voces.

Era domingo, resolvemos almoçar na "Seoul Station", que é uma estação de trens bem grande no centro de Seul e que tem bastante movimento, lojas, restaurantes. Chegando lá nos deparamos com uma imensa manifestação popular, muita gente aglomerava-se em frente a estação, havia um palco e as pessoas que iam chegando, sentavam ao chão, portavam cartazes e repetiam palavras de ordem.

Essa cena me animou. Não precisava entender o que estava escrito nos cartazes, muito menos as palavras de ordem que eram repetidas com energia. Meu corpo vibrava apaixonadamente. Sabia, mesmo sem entender nada, de que lado eu estaria nessa manifestação. 

As pessoas continuavam a chegar, até que chegaram a alguns milhares. Mulheres, jovens, crianças, idosos....pessoas de todas as idades estavam ali. Palavras de ordem era repetidas por todos.

Eu estava ali por acaso, mas não queria sair. Sentia muita força em tudo aquilo que via. Aquela força me alimentava. Pensei no meu pai que foi sindicalista e de quantas lutas e movimentos de greve ele havia feito parte. Meus olhos marejaram. Achei que ele iria gostar de ouvir essa história. Lembrei de uma das minhas idas ao Nepal, quando me vi inesperadamente no meio de um confronto da polícia e populares (na queda da  monarquia nepalêsa) e que um pneu em chamas bateu nas minhas pernas. Lembrei que não senti medo nesse episódio, muito pelo contrário, fiquei extremamente excitada e tomada por uma coragem que me levaria a participar do movimento junto ao povo nepalês, se eu assim pudesse. Lembrei de todas as histórias do Mahatma Gandhi contra o império Inglês e que sempre me tocaram na alma e despertavam em mim algo que pareciam lembranças de outras vidas. Lembranças de lutas populares que nunca nessa vida participei, mas que de alguma forma fazem parte da minha alma. 

O evento em Seul foi incrível. As pessoas de um lado aos milhares e ao lado centenas de policiais que acompanhavam o movimento sem nada fazer. Consegui entender que ali estavam acontecendo vários protestos ao mesmo tempo.

A Coréia encontra-se na mídia internacional essa semana, porque recebe dezenas de Presidentes e Primeiros Ministros  de países do mundo (Obama inclusive) para um encontro sobre Energia Nuclear, e o seu povo aproveitando essa exposição resolveu se organizar em protesto contra o uso da Energia Nuclear, a pesca predatória do salmão, um tratado de comércio assinado entre a Coréia e os EUA, contra o ex-presidente coreano que está sendo julgado por corrupção e outros tantos protestos dentro desse grande protesto que nem consegui identificar. O fato é que o povo aqui protesta.  O povo exige seus direitos e não aceitam que os políticos traiam o povo.


apoio dos religiosos
Seul é uma das maiores cidades do mundo e tem 100% de cobertura por metrô de excelente qualidade, 100% das crianças e jovens na escola, taxa altíssima de jovens em idade universitária que estão na universidade (quase que o dobro da taxa estadosunidense), saúde pública de excelente qualidade e emprego. O povo que viveu uma história infindável de guerras e mais guerras, vive uma prosperidade e crescimentos  desenfreados, e no entanto, protesta. 

Impossível não comparar com o Brasil. Impossível não pensar na nossa acomodação e leniência com políticos corruptos e com desmandos em geral. Impossível não pensar no quanto Salvador (minha cidade) foi abandonada e roubado por governo após governo. Um projeto de metrô que já consumiu milhões e que nunca se concretiza. Impossível não pensar em todos os motivos que temos para protestar.



Impossível não pensar em tudo que acontece no nosso país e o quanto que temos a protestar e que não fazemos. Acho até que nos sentimos superiores aos coreanos. Chegamos até a dizer e (o que é pior), a acreditar que D-us é brasileiro, que somos um povo especial. 

Acho que o povo coreano não se sente especial e talvez até por não se sentirem especiais, pensam que precisam estudar e trabalhar muito. Chego até a concluir que eles acreditam que devem lutar e que o esforço será  recompensado (coisa de babaca no padrão brasileiro). 
Entendi que os coreanos não se acham espertos e muito menos que D-us é coreano. 
Eles acreditam na luta e no esforço.
Eles chegaram lá, mas a luta continua!

Invejo.

Ludmila Rohr